Prevenção de doenças no Brasil: o caminho mais leve para o futuro
O Brasil tem um talento especial para remediar ao invés de prevenir. Funciona assim: deixa o problema crescer, se transformar em crise, para só então agir — sempre correndo, sempre atrasado, sempre gastando mais do que deveria.
Na saúde, esse padrão se repete com uma consistência impressionante.
Pronto-socorros superlotados, UTIs sem leito, profissionais à beira do esgotamento e uma população condicionada a procurar ajuda apenas quando o corpo já não aguenta mais. Tudo isso poderia ser evitado — ou pelo menos reduzido. Mas para isso, seria preciso investir no básico. E o básico, aqui, segue sendo tratado como secundário.
O problema está na raiz
A lógica está invertida. O Ministério da Saúde concentra recursos em curar, não em ensinar a população a não adoecer. O Ministério do Esporte ainda vê o esporte como algo destinado a atletas profissionais, não à população em geral. E o Ministério da Educação segue desconectado da realidade: crianças que crescem paradas viram adultos doentes.
A Educação Física nas escolas continua negligenciada, sem infraestrutura decente e sem um projeto pedagógico que faça sentido. Enquanto isso, estamos criando a geração mais sedentária que o país já teve.
E o resultado? Catastrófico.
Obesidade, sedentarismo e transtornos mentais avançam como epidemias invisíveis, mas devastadoras.
Os números não mentem
A Organização Mundial da Saúde estima que, entre 2020 e 2030, a inatividade física vai custar 300 bilhões de dólares aos sistemas de saúde pública globalmente. A revista The Lancet Global Health calcula um impacto anual de 47,6 bilhões de dólares em gastos diretos ao redor do mundo.
Aqui no Brasil, segundo levantamento da Câmara dos Deputados, o SUS gasta R$ 290 milhões por ano com internações causadas por doenças crônicas relacionadas à inatividade física. Uma redução de apenas 10% nesse índice economizaria R$ 20 milhões anuais só no tratamento de câncer.
Mas, mesmo com esses dados na mesa, o país insiste em tratar a saúde como responsabilidade exclusiva do indivíduo, não como questão de Estado.
Quem quer viver de forma saudável no Brasil precisa remar contra a maré. As cidades não oferecem espaços adequados para atividade física, as escolas não estimulam o movimento e os alimentos ultraprocessados continuam sendo mais acessíveis que os naturais.
E quando alguém adoece, o sistema aponta o dedo: “falta de força de vontade”. Não. Falta estrutura. Falta política pública. Falta prioridade.
Outros países já sacaram
Enquanto isso, há quem já tenha entendido que prevenir é estratégico — não só humano, mas economicamente inteligente.
Em Singapura, o programa Healthier SG concede benefícios fiscais e incentivos financeiros para quem participa de programas de prevenção e mantém hábitos ativos.
Na Noruega, o governo subsidia academias e incentiva empresas a implementarem políticas de bem-estar para seus funcionários.
Nas chamadas Zonas Azuis — regiões como Okinawa (Japão), Nicoya (Costa Rica) e Icária (Grécia) —, a longevidade não é acidente: é resultado de políticas públicas que promovem alimentação de verdade, movimento no cotidiano e fortalecimento dos laços sociais.
Já o Brasil prefere o atalho que sai caro. Espera a doença bater na porta para então medicar. E enquanto isso, a obesidade já superou a desnutrição como o maior problema nutricional do planeta. De acordo com a The Lancet (2024), o mundo atingiu 1 bilhão de pessoas obesas — uma década antes do esperado.
Não é questão estética. É questão civilizatória.
A herança que estamos deixando
E tem algo ainda mais sério: a obesidade e os hábitos dos pais estão moldando geneticamente a saúde dos filhos. Um estudo publicado na Nature Communications (2025) confirma que o comportamento e o ambiente em que vivemos impactam diretamente a expressão genética das próximas gerações.
Traduzindo: um país doente hoje está, literalmente, gerando outro país doente amanhã.
Não é papo de academia. É economia.
Falar de bem-estar não é conversa de nicho. Não é assunto de quem tem tempo e dinheiro sobrando. É falar de política pública eficiente, de economia inteligente, de produtividade nacional e de um futuro possível.
A saúde preventiva deveria ser o centro de qualquer governo que se diz responsável. Mas o Brasil segue apostando no sistema que adoece, na fila que cresce e na conta que nunca fecha.
Prevenir é mais barato — mas o Brasil ainda não aprendeu.
E enquanto não aprender, vai continuar pagando caro: com o orçamento público sangrando, com vidas perdidas e com uma nação inteira dependente de remédio, discurso vazio e promessa sem resultado.